domingo, 9 de setembro de 2012

Embaixo da Amoreira...



EMBAIXO DA AMOREIRA...
Artigo IX
“...Fica permitido que o pão de cada dia
Tenha no homem o sinal de seu suor.
Mas que ,sobretudo tenha
Sempre o quente sabor da ternura... “

Parafraseando Thiago de Melo , também estabeleci  alguns Decretos:  
I – O prazer de fazer de cada aula uma poesia!
II – Deixar-se envolver pela poesia que as crianças trazem no dia a dia.
III – Compreender que essa poesia é simplesmente inerente a elas (as crianças), e que nós adultos devemos (re) aprender com as coisas que elas dizem...

“- Tia, hoje é dia de aula de Artes com argila?”
“- Sim, vamos fazer cerâmica Marajoara!”
Fazemos planos. Planos de aula. Que bom que eles são, podem e devem  ser flexíveis. Está prevista uma exposição para o dia 06 de setembro. Dentro do nosso “Projeto de Pesquisa Cartas para Mikael”, vamos organizar um painel e vamos apresentar o Carimbó, dança típica do Estado do Pará. Dentro de todo esse planejamento está previsto  também o trabalho com a argila, para relembrar a cerâmica Marajoara. Fazer algumas peças, experimentar o prazer de mexer no barro e transformá-lo em um objeto de arte.
No lado de fora de nossa sala há uma amoreira, motivo de festa, alegria, sabor. Fomos para lá “fazer nossas obras de arte”. Recebemos a visita de nossa Coordenadora,  que é apaixonada pelo nosso trabalho. O prazer de trabalhar com a argila era tanto que esqueceram o objetivo dele. Ao serem questionados  sobre o que estavam fazendo só respondiam em coro: “ ARGILA” .  Objetivo? Que objetivo?  O que eu, como professora, tinha pensado com esse trabalho? Me questiono , às vezes, quem está aprendendo o quê?  Quem está aprendendo com quem?  Que objetivos estamos alcançando com esse trabalho? E quase sempre são as crianças  que me trazem de volta desses  devaneios com atos e palavras simples. Ver o prazer com o qual as crianças utilizaram a argila, seus olhos brilhando de satisfação em transformar e  transformar o barro muitas  e muitas vezes, desenhar, redesenhar, sorrir e rir  de si e dos outros.  Perceber que não havia espaço para o não sou capaz, para o não consigo, ou para outras tantas amarras que nos são colocadas cotidianamente.  Tudo isso me fez parar de pensar e apenas observar,  aproveitando a poesia do momento.
Construir, desconstruir, sujar-se de barro e adorar estar assim! São tantas emoções, sentimentos, que as palavras são poucas, por vezes escassas, indizíveis (se é que isso é possível)!
No meio dessa folia de sensações, uma aluna, após terminar sua obra, me pergunta:
-Tia, minha mãe pediu que a próxima vez que nós viéssemos aqui fora, eu levasse amoras para ela. Posso pegar?[1]
Respondi: “ Claro que sim. “
A mãe está grávida e com desejo de comer amoras. Aqui entra a segunda parte da poesia do momento. Não há fotos, descrições ou teorias que expliquem o quadro que se formou (ou se pintou) a minha frente:
Kaylanne recolhe amoras no chão.  Thainá passa a ajudá-la.  Os outros mexem com a   argila, conversando, sorrindo, experimentando, molhando as mãos.  Marcelo deixa sua obra para secar ao Sol e passa também a recolher as amoras.  Os três vem com as mãozinhas cheias de amoras, vermelhas, pretas, inteiras, amassadas, com carinho para não machucá-las e depositam no copo descartável que eu já havia providenciado.
Não há palavras. Há ternura, solidariedade, carinho, amor, atenção, cuidado. Compartilhamento. Há a doçura de colher e ofertar amoras a quem se ama sendo auxiliado por quem divide momentos de aprendizagem.
Após as obras terem sido terminadas pergunto: E aí, o que vocês acharam de trabalhar com a argila?
Resposta geral: “ Precisamos é  fazer isso mais vezes...”

Decreto IV:  Fica terminantemente proibido não se emocionar...

Gisele de Oliveira Silva
Professora Alfabetizadora


[1] Até pouco tempo atrás era bastante comum a presença de uma amoreira no quintal das casas. Rústicas, resistentes e de fácil cultivo eram a garantia de frutos doces e deliciosos para a alegria de crianças e adultos. Com o passar do tempo (e com o fim dos quintais), as amoreiras passaram a ser vistas como plantas silvestres. Seus frutos, delicados e perecíveis, não são capazes de sobreviver à aventura de sair do campo e chegar aos supermercados e, assim, as amoras foram gradualmente ficando na doce lembrança de quem tinha o privilégio de degustá-las ali mesmo, ao lado da árvore.











 Algumas fotos para ilustrar o momento!

Um comentário:

  1. Lindo trabalho Gi! Parabéns pela dedicação, força e amorosidade pela educação e pelos/as alunos/as!!!!!

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